Reflexões acerca da esquizofrenia na abordagem gestáltica


Reflexões acerca da esquizofrenia na abordagem gestáltica


Resumo
Este artigo é parte do trabalho “Psicopatologia na abordagem gestáltica: reflexões acerca da esquizofrenia”, elaborado para a conclusão do curso de especialização em Gestalt-terapia. 

O trabalho tem como objetivo compreender os sintomas da esquizofrenia dentro da perspectiva gestáltica, apresentando pontos importantes da teoria e discutindo sobre uma possível conduta terapêutica nesses casos. 

No artigo será dada ênfase à compreensão diagnóstica e ações terapêuticas na esquizofrenia. Sendo assim, será abordado o Ciclo do Contato proposto por Jorge Ponciano Ribeiro, dentre outros conceitos, permitindo uma compreensão fenomenológica e pertinente à abordagem gestáltica, respeitando a singularidade da vivência esquizofrênica.

Palavras-chave: Gestalt; Saúde mental; Esquizofrenia; Intervenção terapêutica.

https://www.scielo.br/j/jbpsiq/a/mdyYbWJqv6w4v4pQfJkdV5g/  
Infecção: fator de risco pré-natal para o desenvolvimento da esquizofrenia 

https://www.youtube.com/watch?v=R5Rr2ZzilI4



HISTÓRIA

Num tranquilo bairro suburbano, vive a família Silva. José, o patriarca, é um homem carinhoso, casado com Ana, uma mulher amorosa e dedicada. Juntos, criaram quatro filhos adoráveis: Mateus, Laura, Sofia e Gabriel. Aparentemente, eram uma família feliz, mas um desafio invisível os afligia.

José, secretamente, lutava contra a esquizofrenia, uma batalha interna que o impedia de manter um emprego estável. A família, sem compreender completamente a situação, tentava apoiá-lo da melhor forma possível, mas a co-dependência estava começando a afetar a todos.

Um dia, Ana percebeu que algo precisava mudar. 

Ela começou a pesquisar sobre a esquizofrenia e, com a ajuda de um profissional de saúde mental, entenderam melhor a condição de José. 

Com o diagnóstico claro, a família pôde focar em estratégias para melhorar a qualidade de vida de todos.

  1. Educação sobre a Esquizofrenia: Ana e as crianças aprenderam mais sobre a condição de José. Isso os ajudou a compreender suas necessidades e a lidar com os desafios diários.
  2. Apoio Profissional: A família procurou ajuda de profissionais de saúde mental. José começou a frequentar terapia regularmente, o que o ajudou a gerenciar seus sintomas e a construir estratégias para enfrentar os desafios diários.
  3. Comunicação Aberta: A comunicação aberta se tornou a base para a cura da família. Todos compartilharam seus sentimentos e preocupações, criando um ambiente seguro para expressar suas emoções.
  4. Divisão de Responsabilidades: A família percebeu a importância de compartilhar responsabilidades. As crianças assumiram tarefas domésticas adequadas à idade, aliviando a pressão sobre os pais.
  5. Rede de Apoio Social: Amigos e familiares foram informados sobre a situação e se tornaram uma rede de apoio valiosa. Isso proporcionou momentos de descanso para Ana e permitiu que José se sentisse apoiado em diversas situações.

À medida que a saúde mental de José melhorava, a família começou a traçar planos para o futuro. Com o apoio de terapeutas de reabilitação e mentores de negócios, José identificou suas paixões e habilidades. Com paciência, ele deu os primeiros passos em direção a empreender.

A família Silva enfrentou adversidades, mas com amor, compreensão e o devido suporte, eles encontraram uma maneira de viver uma vida mais plena e feliz. O sucesso de José como empreendedor foi a prova de que, com a abordagem certa, até os desafios mais difíceis podem ser superados.

Com o apoio contínuo da família e da comunidade, José lançou-se no mundo dos negócios. Sua jornada empreendedora começou devagar, mas cada pequena conquista impulsionou sua confiança e determinação. Ele fundou um pequeno negócio de prestação de serviços que se alinhava às suas habilidades e interesses.

Ana, sempre ao lado de José, desempenhou um papel fundamental na gestão do lar e na promoção de um ambiente estável para a família. As crianças, agora mais conscientes sobre a saúde mental, também participaram ativamente no apoio ao pai e no crescimento do negócio familiar.

A família Silva tornou-se uma fonte de inspiração para outras famílias que enfrentavam desafios semelhantes. Juntos, compartilharam suas experiências em eventos locais, ajudando a reduzir o estigma em torno da saúde mental.

A busca de José por equilíbrio entre a saúde mental e o empreendedorismo não foi fácil, mas os benefícios eram evidentes. Ele encontrou um propósito em sua jornada e, ao mesmo tempo, conseguiu proporcionar estabilidade financeira para sua família.

A trajetória da família Silva destaca a importância da compreensão, empatia e apoio mútuo. Ao abordar a saúde mental como uma prioridade, eles transformaram seus desafios em oportunidades de crescimento pessoal e familiar.

No final, a família Silva não apenas superou as adversidades, mas também construiu uma vida significativa e próspera. Seu exemplo ressalta que, com amor e resiliência, é possível criar um futuro promissor, mesmo diante das circunstâncias mais desafiadoras.

 


Exercício de Perguntas e Respostas sobre a História da Família Silva:

  1. Pergunta: Qual é o desafio principal enfrentado por José, o patriarca da família Silva?

    • Resposta: José enfrenta a esquizofrenia, uma condição de saúde mental que afeta sua capacidade de manter um emprego estável.

  2. Pergunta: Como Ana, a esposa de José, contribuiu para o bem-estar da família?

    • Resposta: Ana desempenhou um papel fundamental na busca de apoio profissional para José, gerenciou o lar e criou um ambiente estável para a família.

  3. Pergunta: Quais são os nomes dos quatro filhos de José e Ana?

    • Resposta: Os filhos são Mateus, Laura, Sofia e Gabriel.

  4. Pergunta: Quais são algumas estratégias que a família adotou para lidar com a esquizofrenia de José?

    • Resposta: A família adotou a educação sobre a esquizofrenia, buscando apoio profissional, promovendo a comunicação aberta e compartilhando responsabilidades.

  5. Pergunta: O que a família fez para criar uma rede de apoio social?

    • Resposta: Amigos e familiares foram informados sobre a situação e se tornaram uma rede de apoio valiosa para a família.

  6. Pergunta: Como as crianças contribuíram para o apoio ao pai e para o crescimento do negócio familiar?

    • Resposta: As crianças, conscientes sobre a saúde mental, participaram ativamente no apoio ao pai e no crescimento do negócio familiar, assumindo tarefas adequadas à idade.

  7. Pergunta: Qual foi a conquista significativa de José na história?

    • Resposta: José conseguiu superar os desafios da esquizofrenia e tornou-se um empreendedor de sucesso, fundando um negócio de prestação de serviços alinhado às suas habilidades e interesses.

  8. Pergunta: Além do sucesso profissional, qual foi o impacto da trajetória da família Silva?

    • Resposta: A família Silva tornou-se uma fonte de inspiração, compartilhando suas experiências para reduzir o estigma em torno da saúde mental e oferecendo suporte a outras famílias em situações semelhantes.


Exercício de Reflexão Filosófica: A Jornada da Família Silva

  1. Pergunta: Na história da Família Silva, como a compreensão da esquizofrenia influenciou a forma como a família abordou os desafios?

    • Reflexão: Reflita sobre como o conhecimento sobre a condição de José impactou a abordagem da família em relação à sua saúde mental.

  2. Pergunta: De que maneira a comunicação aberta se tornou uma pedra angular na trajetória da família?

    • Reflexão: Considere como a comunicação aberta contribuiu para a compreensão mútua e fortaleceu os laços familiares diante dos desafios.

  3. Pergunta: Como a busca por equilíbrio entre a saúde mental e o empreendedorismo reflete princípios filosóficos como a busca por um propósito de vida?

    • Reflexão: Explore como a busca de José por um equilíbrio entre sua saúde mental e o empreendedorismo pode ser vista como uma busca por significado e propósito.

  4. Pergunta: Na história, a família Silva enfrentou o estigma em torno da saúde mental. Como isso se relaciona com a filosofia da ética e da compaixão?

    • Reflexão: Analise como a família Silva, ao compartilhar suas experiências para combater o estigma, demonstra valores éticos e compassivos na sociedade.

  5. Pergunta: Em que medida a história da família Silva destaca a importância da resiliência como um conceito filosófico?

    • Reflexão: Reflita sobre como a resiliência da família Silva diante dos desafios pode ser interpretada à luz de conceitos filosóficos, como a força interior e a capacidade de superação.

  6. Pergunta: Como a filosofia do cuidado próprio (self-care) pode ser aplicada na jornada de José em busca de equilíbrio e superação?

    • Reflexão: Pondere sobre como as práticas de cuidado próprio poderiam ter impactado positivamente a jornada de José e da família.

Esses exercícios buscam estimular a reflexão sobre os aspectos filosóficos presentes na história da Família Silva, promovendo insights e conexões entre os eventos narrados e os princípios filosóficos.


Exercício de Expressão Emocional: "Carta aos Sentimentos"

Este exercício é uma oportunidade para você, o paciente explorar seus próprios sentimentos, pensamentos e experiências de uma maneira reflexiva.

Escreva uma carta aos seus sentimentos, expressando-se livremente.

Aqui estão algumas instruções para o exercício:

  1. Início da Carta:

    • Comece a carta dirigindo-se aos seus próprios sentimentos. Por exemplo, "Queridos sentimentos," ou "Caros pensamentos,".

  2. Identificação Emocional:

    • Liste algumas emoções que você tem sentido ultimamente. Pode ser felicidade, tristeza, ansiedade, medo, ou qualquer outra emoção que esteja presente.

  3. Exploração Profunda:

    • Escolha uma emoção específica e explique por que você a está sentindo. Tente mergulhar mais fundo, explorando as razões subjacentes e as situações que podem estar contribuindo para essa emoção.

  4. Reflexão sobre Experiências Passadas:

    • Reflita sobre experiências passadas que possam estar influenciando seus sentimentos atuais. Como essas experiências moldaram a forma como você lida com as emoções?

  5. Descreva seus Desafios:

    • Identifique os desafios específicos que você enfrenta ao lidar com suas emoções. Isso pode incluir situações do dia a dia, interações sociais ou questões pessoais.

  6. Expressão de Gratidão ou Esperança:

    • Termine a carta expressando gratidão por algo positivo em sua vida ou compartilhando esperanças para o futuro. Isso pode ser uma maneira de equilibrar as emoções mais desafiadoras.

  7. Revisão e Reflexão:

    • Após escrever a carta, reserve um tempo para relê-la. Observe as emoções que surgiram durante esse exercício e pense em como esse processo de escrita pode impactar sua compreensão de si mesmo.

Este exercício pode ser uma ferramenta terapêutica valiosa para explorar e expressar seus sentimentos de uma maneira que promova a autoconsciência e o entendimento emocional. Encorajo você compartilhar suas reflexões durante as sessões para aprofundar ainda mais a compreensão mútua.







Introdução

A preocupação com o cuidado em saúde mental vem crescendo em decorrência da ampliação das políticas públicas em relação às ações e serviços de saúde, bem como das mudanças ideológicas frente ao atendimento oferecido às pessoas com transtorno mental. 

Nesse sentido, a atual política de saúde mental no Brasil preconiza o resgate da cidadania e autonomia da pessoa com sofrimento psíquico. 

Toda a prática em saúde mental envolve a atuação de uma equipe multidisciplinar bem como a implicação da família, da sociedade e, principalmente, da pessoa que sofre.

Assim, define-se a esquizofrenia como um dos transtornos mentais mais graves que existe, seja por sua sintomatologia, seja pela prevalência mundial (cerca de 1% da população, segundo dados da Organização Mundial da Saúde – OMS). 

A esquizofrenia se manifesta no final da adolescência ou no início da vida adulta, tanto nos homens quanto nas mulheres, podendo igualmente ocorrer na infância ou meia-idade.

De acordo com o DSM-IV (2003) – manual diagnóstico em psiquiatria publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA) – a esquizofrenia é definida nas suas características essenciais com presença de sintomas psicóticos, tais como 
  • delírios, 
  • alucinações, 
  • dissociação do pensamento, 
  • comportamento desorganizado ou catatônico e 
  • afetividade embotada. 

É um quadro complexo apresentando sinais e sintomas na área do pensamento, percepção e emoções, causando prejuízo nos cuidados pessoais, ocupacionais e nas relações interpessoais e familiares.

Atualmente, o cuidado em saúde mental traz uma nova concepção em torno da compreensão da pessoa com transtorno mental e das suas possibilidades de mudança.

Este cuidado considera o indivíduo e o seu sofrimento, e não somente o diagnóstico, possibilitando um olhar integral da situação que compreende, além do indivíduo, a família e o meio social.

A proposta de se discutir as intervenções da abordagem gestáltica em saúde mental surge do possível diálogo entre o que preconiza a atual política de saúde e a teoria da Gestalt, por seus princípios e concepções de homem e de mundo, enfatizando a potencialidade do ser humano mesmo nos casos em que há um grave acometimento psíquico e existencial.


Este trabalho tem como objetivo compreender os sintomas da esquizofrenia dentro da perspectiva gestáltica, apresentando pontos importantes da teoria e discutindo sobre uma possível conduta terapêutica nesses casos. 

No artigo será dada ênfase à compreensão diagnóstica e ações terapêuticas na esquizofrenia. Será abordado o ciclo do contato proposto por Jorge Ponciano
Ribeiro, dentre outros conceitos, permitindo uma compreensão fenomenológica e pertinente à abordagem gestáltica, respeitando a singularidade da vivência esquizofrênica.

Introduzindo o diagnóstico na perspectiva gestáltica: ciclo do contato

O processo do diagnóstico em saúde mental envolve a identificação do padrão funcional de uma pessoa através da escuta, observação dos sintomas e compreensão da sua vivência. Essa compreensão irá nortear uma intervenção terapêutica mais apropriada para o paciente.

Na Gestalt-terapia, o diagnóstico tem como objetivo identificar e explicitar o modo pelo qual o indivíduo se relaciona com o ambiente e de que forma significa a sua própria experiência (TENÓRIO, 2003). 

O diagnóstico deve ser construído no contato, dentro do ambiente terapêutico. Souza (et al., 2001) acredita que ao diagnosticar “é importante considerar de que maneira o cliente mantém o seu processo de awareness, de que forma percorre o ciclo do contato, quais são os mecanismos de interrupção do contato que utiliza e qual o seu suporte disponível, considerando seu funcionamento”.

O ciclo do contato corresponde segundo Ribeiro (2006), a “um modelo (...) que se propõe a explicar didaticamente o jeito como as pessoas fazem contato, produzindo, vivendo, se expressando e bloqueando sua relação com o outro” (p. 87). Refere-se ao campo no qual a pessoa expressa suas possibilidades dentro da realidade vivida.

O ciclo do contato, por sua vez, é considerado um indicador diagnóstico e de psicoterapia, assim como afirma Ribeiro (1995, p. 24 apud PIMENTEL, 2003) “uma Gestalt, um paradigma ou um modelo para pensar a psicopatologia do sintoma, o psicodiagnóstico e um programa de cura” (p. 75). 

O ciclo permite um olhar sobre o funcionamento do indivíduo ao mesmo tempo em que propõe intervenções terapêuticas.

A partir da figura abaixo se pode ter uma visão da forma como o autor propõe o ciclo do contato.








Este ciclo do contato corresponde a um ciclo integrado dos sistemas, níveis e funções que envolvem os fatores de cura e bloqueios do contato. Os três sistemas destacados são elementos básicos da personalidade – motor, cognitivo e sensório-afetivo – e as funções do self. 

Tal disposição do ciclo permite uma visão diagnóstica rápida ao se identificar os mecanismos do contato nos sistemas correspondentes e nas funções do self.

No centro do ciclo aparece o self como “um centro operacional de controle de energia em forma de contato, de tal modo que o self é o retrato de como a pessoa funciona, em dado campo” (RIBEIRO, 2007, p. 19-20). 

A observação do self permite um olhar sobre a identidade de uma pessoa em contato.

Uma desarmonia ou interrupção nessa relação resultaria em um processo psicopatológico.

O ciclo do contato é composto por nove processos denominados fatores de cura:

  • fluidez, 
  • sensação, 
  • consciência, 
  • mobilização, 
  • ação, interação, 
  • contato final, 
  • satisfação, 
  • retirada

Cada um desses fatores é visto como um passo à saúde, como forma de contato pleno. O fator de cura é definido por Ribeiro (2007) como:


“(...) um processo por meio do qual a pessoa experiencia, em dado
momento, uma sensação de que algo novo, portador de mudança e de
bem-estar, penetrou no seu universo cognitivo, e, através de uma
consciência emocionada, provocada pela percepção de uma totalidade
dinamicamente transformadora, sente-se inclinada, motivada, fortalecida
para mudar” (p. 57).



O ciclo do contato, portanto, está relacionado ao processo de cura e mudança através de uma sequência contínua de figura-fundo, de trocas com o meio e satisfação de necessidades. 

As necessidades identificadas mobilizam o organismo em busca de uma resolução. O organismo diante da satisfação faz o fechamento do seu processo assimilando toda a experiência. Durante todo o processo estão presentes funções perceptivas, motoras e sensório-afetivas que funcionam de modo integrado na mudança.

Entretanto, durante esse processo pode haver interrupções ou bloqueios que impossibilitem uma resolução satisfatória das necessidades do organismo. 

De acordo com a teoria da Gestalt-terapia, assim como apontam Antony & Ribeiro (2004), “os bloqueios do contato são mecanismos psicológicos que exercem funções defensivas e constituem padrões de comportamento e percepção” (p. 130). 

Através de tais mecanismos o indivíduo fica impedido de realizar contatos saudáveis a partir do momento que mantém, no presente, situações inacabadas.

É importante observar que os mecanismos de defesa podem ser saudáveis ou patológicos, dependo da forma como o indivíduo se utiliza deles. Ainda segundo os autores citados anteriormente, “esses processos do contato possuem uma função saudável quando empregados flexivelmente, atendendo às condições da situação e às necessidades do indivíduo” (p. 130). É necessário observar a frequência com que os mecanismos ocorrem e se estão sendo utilizados indiscriminadamente ou de forma cristalizada.


Observando a esquizofrenia no ciclo do contato, as disfunções mais comuns são as que
correspondem à função id do self, sendo elas a deflexão, a fixação e a dessensibilização.
A deflexão, segundo Delisle (1999), é uma estratégia para reduzir a intensidade do contato como, por exemplo, o desvio do olhar, a utilização de termos vagos e a expressão de forma exagerada.


A ideia de deflexão, proveniente da palavra latina “deflexiōne”, é usada no campo da física para nomear o ato de desviar a direção de uma corrente ou fluido. Esta é apenas uma das definições da palavra, pois a palavra pode ser usada em vários campos.

 No campo da engenharia, a deflexão é a deformação que um elemento registra a partir da aplicação de uma força. A deflexão, nesse contexto, é gerada por flexão interna.

 É possível calcular a deflexão de acordo com as leis que ligam as forças e os deslocamentos através de um método geométrico ou de energia. A deflexão é uma resposta estrutural perante as aplicações de cargas.

 O conceito de deflexão também é usado na psicologia. Nesse caso, a deflexão funciona como um mecanismo de defesa que consiste em desviar ou evitar um contato, uma emoção ou uma sensação. Se uma determinada situação causa estresse a um indivíduo, o sujeito pode recorrer à deflexão para fugir dessa situação e não ser forçado a enfrentá-la.

 A deflexão faz com que uma pessoa execute uma ação que não precisa executar ou que permite que ela não faça algo que, na verdade, deseja fazer. Tudo para bloquear o que ela não quer experimentar.

 Por fim, no campo da botânica, a noção de deflexão é usada para se referir à inclinação para baixo de um ou mais órgãos. Uma flor com deflexão exibe seu pedúnculo torcido.

 Citação Equipe editorial de Conceito.de. (26 de Maio de 2020). Deflexão - O que é, conceito e definição. Conceito.de. https://conceito.de/deflexao




Como adaptação, a deflexão permite reduzir a intensidade da experiência que seria insuportável, pois nem sempre uma pessoa quer que o contato seja intenso.

Para Ribeiro (2007), a fixação refere-se ao processo através do qual uma pessoa se apega excessivamente a pessoas, idéias, coisas e, temendo correr riscos, tende a se manter fixada nas mesmas situações sendo incapaz de explorar novas possibilidades. 

Ainda segundo o autor, no caso da dessensibilização, a pessoa se sente anestesiada diante do contato, apresenta diminuição sensorial no corpo e dificuldade para se estimular perdendo, consequentemente, o interesse por sensações novas.

As disfunções de contato apresentadas acima podem ser consideradas saudáveis em determinadas situações do cotidiano, desde que não interrompam a fluidez do ciclo. São consideradas funções de segurança, sendo um aspecto do self indispensável à saúde. São exemplos de disfunções “saudáveis”: a fuga, o sono, entrar em estado de choque, a regressão, os sonhos etc. Entretanto, quando utilizadas repetidamente tornam-se patológicas, como ocorre na esquizofrenia.

A compreensão da esquizofrenia na abordagem gestáltica

A maior parte das psicopatologias, incluindo a esquizofrenia, estaria relacionada a um estreitamento da relação do indivíduo consigo mesmo e com seu meio, prejudicando o contato e, consequentemente, o seu desenvolvimento saudável.

Segundo Hycner (1989 apud HOLANDA, 1998), “a psicopatologia é resultado de um ‘precoce diálogo abortado’. Isto significa que, no mais profundo modo de encontrar os outros, essa pessoa não é ‘ouvida’ e sua voz torna-se monológica e tragicamente um ‘movimento interno’” (p. 41).

De acordo com a filosofia dialógica, a desestruturação psicótica deve-se a uma não-valorização da experiência pessoal pelo outro. Em consequência disso a pessoa “não pode sentir-se confirmada e, portanto, não é capaz de apreciar e valorizar sua própria experiência, tem de rejeitá-la, alienando uma parte de si mesma, que vai tornar-se inconsciente” (HYCNER, 1995 apud TENÓRIO, 2003, p. 39). 

Por exemplo, pais que não foram capazes de entender, considerar e valorizar a experiência da criança. Esta, então, perde seu referencial deixando de entrar em contato consigo mesma, seus desejos, vontades e sensações, ao ter que atender às expectativas de outras pessoas, resultando em contatos distorcidos e limitados.

Friedman (1985 apud SANTOS, 2005) também aponta para a ausência de confirmação da experiência pelo outro no histórico de pacientes esquizofrênicos.

“Não há uma concordância quanto à causa da esquizofrenia, no
entanto, na história familiar de pessoas com esquizofrenia nota-se que
não houve espaço para que a criança tomasse como real o que ela
percebia e sentia. Geralmente suas concepções foram coagidas a
serem substituídas pela doutrinação dos pais, ou seja, suas percepções
e sentimentos não foram confirmados como sendo reais, autênticos e
nem mesmo possíveis. Não sendo livre para sentir ou agir, a única
opção (além de se tornar um só à medida que aceite por completo a
imposição dos pais) é o isolamento total, a loucura” (p. 82).


Ainda em relação ao prejuízo no contato, Tenório (2003) coloca que:


“Na psicose há um processo de profunda alienação de si mesmo e do

outro, por conta de uma total impossibilidade de se estabelecer um

diálogo com o outro (EU-TU). O outro teve que ser alienado por se

revelar excessivamente poderoso e nocivo à preservação do eu. Esse

eu tornou-se desconhecido em virtude de tantas defesas e negações de

si mesmo, na tentativa de minimizar a ameaça externa” (p. 40).


De acordo com a passagem acima, pode-se dizer que na psicose há um comprometimento com a questão relacional, neste caso por uma fuga do contato. Diante da desconfirmação e da ameaça, o indivíduo tende a se afastar e se isolar da situação que gera sofrimento. “Na situação específica de um esquizofrênico, por exemplo, existe um obstáculo visível: a não-disposição do outro em sair de seu mundo próprio” (HOLANDA, 1998, p. 41).


“O outro passa a ser visto como agente promotor de angústia e

sofrimento uma vez que é fonte de desconfirmação. Isto explica então o

papel da presença neste tipo de personalidade. (...) para o

esquizofrênico, há um vazio da presença. Ele recorre à ‘segurança’ do

seu isolamento na tentativa de não se sentir ameaçado por qualquer

presença que possa mais uma vez desintegrar seu self diante nova

desconfirmação” (PETRELLI, 2004 apud SANTOS, 2005, p. 182).


 O reconhecimento do próprio self é premissa básica para o fluxo contínuo do ciclo do contato. 

desconfirmação do self interrompe o contato do “eu” consigo mesmo e com o mundo, além da impossibilidade de diferenciação entre a própria experiência e a do outro que é imposta como única e verdadeira (fixação). Neste caso surge a confluência.

Segundo Delisle (1999), a confluência acontece quando a fronteira de contato é tão ofuscada que não permite a distinção entre indivíduo e ambiente. A fronteira não é experienciada refletindo na dificuldade para fazer contato. Não há clareza na representação do “eu” em oposição ao “não-eu”. A confluência ocorre quando o indivíduo é incapaz de focar na sua própria experiência e, sem intenção, se funde com outra pessoa.

Na esquizofrenia a confluência surge de uma relação de não-contato com necessidades autênticas já que o indivíduo durante a sua vida criou uma “dependência” diante da desconfirmação e escolhas do outro. O indivíduo perde a espontaneidade e a capacidade de focar na sua própria experiência ficando paralisado e interrompendo o contato.


Segundo Robine (2006), a confluência é “um apego a uma situação antiga que se tornou obsoleta” (p. 106). Diante da “segurança” de buscar no outro a satisfação das suas necessidades, o esquizofrênico continua fixado nessa situação. Por não se tratar da sua necessidade, mas sim do outro, o indivíduo vivencia situações interrompidas ou não-satisfeitas, sendo submetido a sucessivas interrupções no fluxo natural entre figura-fundo gerando o sofrimento.


“É comum encontrarmos psicopatologias graves em pessoas com tais

históricos, principalmente psicopatologias que implicam em uma divisão

interna muito profunda, quando a pessoa se vê fragmentada, e cujas

partes não entram em contato, ou tal contato é ocasional ou instável,

como na esquizofrenia ou outras patologias esquizóides” (ZINKER,

1979, p. 85 apud RODRIGUES, 2000, p. 125).



A indiferenciação entre o “eu” e o “não-eu” torna o indivíduo alienado do meio. Um exemplo disso 
são as alucinações presentes nos quadros de esquizofrenia. A experiência alucinatória é vivenciada como real e natural, não estando separada do “eu”. 

Dessa forma, o paciente “(...) perde contato com o mundo em que vivem os indivíduos não-patológicos. Pela falta da capacidade de afastar-se de sua própria experiência, não está potencializado a compartilhá-la” (SANTOS, 2006, p. 346).

Além da compreensão da relação baseada no dialógico, outros autores ainda chamam a atenção para o self – alvo da desconfirmação – e suas funções. A psicose – incluindo a esquizofrenia –assim como afirma Goodman (apud GINGER & GINGER, 1995) corresponde, sobretudo, “a uma perturbação da função id: a sensibilidade e a disponibilidade do sujeito às excitações externas ou internas estão perturbadas: ele não responde claramente ao mundo exterior nem às suas próprias necessidades” (p. 128), estando desconectado da realidade.


Perls (1969, p. 173-5 apud MÜLLER-GRANZOTTO & MÜLLER-GRANZOTTO, 2008, p. 4), apresenta algo semelhante sobre a psicose:


“O psicótico tem uma camada de morte muito grande, e esta zona morta

não consegue ser alimentada pela força vital. Uma coisa que sabemos

ao certo é que a energia vital, energia biológica (...), torna-se

incontrolável no caso da psicose. (...) o psicótico nem mesmo tenta lidar

com as frustrações; ele simplesmente nega as frustrações e se

comporta como se elas não existissem”.


A psicose, segundo Latner (1973), “aparece em situações extremas onde há uma falta de equilíbrio das funções do self” (p. 141). 

O contato com o campo é severamente reduzido e leva a uma ruptura na coordenação dos modos id e ego gerando o conflito. Ocorre uma fragilidade do modo ego (perda de controle) diante de tanta energia (excitamento) que não é definida de acordo com a sua relevância do momento. A incapacidade para retornar ao funcionamento espontâneo, faz com que o self se torne predominantemente id.

Perls (1969a, p. 135 apud LATNER, 1973) confirma tal compreensão ao afirmar que “nas psicoses, a energia presente não pode ser controlada e, ao invés de ser distribuída de forma discriminada, ela vem em excesso” (p. 142). Toda energia disponível não consegue ser distribuída de forma equilibrada e funcional.

Com um contato escasso, a frouxidão das fronteiras do id torna-se exacerbada e podem surgir disfunções do contato, tais como introjeção, projeção, confluência, decorrentes da perturbação de si mesmo e do campo. Latner coloca que essa é uma descrição geral dos aspectos presentes em desordens severas que se caracterizam pela perda de controle do self.

Ainda de acordo com este autor, “(...) o funcionamento com preponderância no modo id em geral são mais extremos e perturbados do que os que persistem no modo ego” (LATNER, 1973, p. 143), como o narcisismo, a megalomania e a paranóia. 

Em geral, quando a função ego é bem desenvolvida e permite a manipulação do contato com o campo o indivíduo passa a ter mais habilidade para moderar as disfunções, fato contrário ao que ocorre com a função id.

Geralmente, o modo ego tende a assumir a dominância não-saudável em busca da ação, procurando pelos excitamentos que a função id não foi capaz de fornecer ou forneceu de forma desarticulada. Entretanto, a ação do ego nesse funcionamento “emergencial” não é suficiente para assegurar a satisfação das necessidades.

Em algumas desordens, como na psicose, a função id estaria, por alguma razão, ausente, falhada ou desarticulada, como mostra Müller-Granzotto & Müller-Granzotto (2008):


“a função id (que justamente se caracteriza pela formação e mobilização

do fundo de excitamentos) não cumpriria seu papel, razão pela qual a

função ego (caracterizada pela ação motora e linguageira) estaria

desprovida dos motivos para lidar com o dado na fronteira de contato”

(p. 9-10).


O sistema self seria, então, acometido de uma espécie de ‘rigidez (fixação)’” (PERLS, HEFFERLINE & GOODMAN, 1951, p. 34 apud MÜLLER-GRANZOTTO & MÜLLER-GRANZOTTO, 2008, p. 9-10) (grifo dos autores), tal como observado nos comportamentos por vezes descritos pela psiquiatria. Um exemplo disso poderia ser o descuido com a higiene pessoal que pacientes com o quadro de esquizofrenia costumam apresentar. Já que o fundo de excitamentos se encontra comprometido, o seu próprio corpo ou “dado”, como colocam os autores Müller-Granzotto, neste caso não seria percebido, passando a ser descuidado e até negado.

A persistência modo id pode “aumentar nossa energia e atividades bizarras – ou talvez simplesmente parar-nos, catatônicos” (LATNER, 1973, p. 145). 

Nessa passagem Latner resume o funcionamento do organismo no modo id quando o self está prejudicado. Como visto acima, o excitamento, ou vem em excesso, não se identificando as figuras que precisam ser fechadas, ou não ocorre, permanecendo diluído no fundo do self.

Dessa forma, o self permanece fechado para o fluxo de diferenciação com o campo estando unificado às experiências provindas do ambiente. O indivíduo se torna inseparável das coisas que participa e toda sua vivência está integrada ao meio. Nesse movimento confluente o resultado é a perda da realidade onde o indivíduo não consegue se distinguir do meio e nem perceber o que está realmente acontecendo consigo mesmo.

Ao se observar o ciclo do contato proposto por Ribeiro (2007) é possível perceber de que forma o self funciona dentro da função id e como a esquizofrenia é vivenciada no campo.


Com base nos mecanismos de interrupção do contato correspondentes ao self na função id – 
deflexão, dessensibilização e fixação – pode-se fazer uma rápida referência aos comportamentos observados na esquizofrenia para uma compreensão didática.

A deflexão pode ser observada nos casos em que há falta de contato com o outro no momento em que o paciente vivencia o contato com as suas vozes (alucinações auditivas). A dessensibilização está presente nos casos em que o paciente ignora as sensações dolorosas. A fixação pode ter relação com o pensamento concreto, levando ao “pé da letra” tudo que lhe é dito.

De modo integrado às interrupções do contato, as funções sensoriais e afetivas encontram-se comprometidas resultando na dificuldade apontada por Goodman: necessidades não identificadas e contatos interrompidos. Essas funções presentes no ciclo do contato correspondem às descrições obtidas nos manuais de classificação diagnóstica em psiquiatria quanto à referência do comprometimento sensorial e afetivo na esquizofrenia.

As alucinações observadas nos quadros psicóticos se referem a um erro no registro sensorial, ou seja, uma percepção sensorial que ocorre na ausência do estímulo do órgão sensorial correspondente. Outro sintoma fundamental no diagnóstico é o comprometimento afetivo que é manifestado através da diminuição na habilidade de expressar-se emocionalmente, inabilidade de experimentar prazer, perda de interesse pela interação social, dentre outros.

Diante do que foi abordado acerca da perturbação presente nas relações de contato de pacientes esquizofrênicos, pode-se dizer que os mesmos não conseguem manter espontaneamente o contato consigo mesmo e com o mundo a sua volta de forma autorreguladora.

Segundo Vicentini (2007), o paciente psiquiátrico “não consegue perceber sua morbidez e/ou suas necessidades pela incapacidade de entrar em contato consigo mesmo, quer seja por mecanismos de defesa ou até mesmo por déficit intelectual”. 

Entretanto, essa dificuldade pode ser minimizada através de intervenções que auxiliem na configuração de um novo funcionamento.

Conduta e intervenções terapêuticas na esquizofrenia

No funcionamento saudável e equilibrado, o indivíduo passa a identificar suas necessidades e, ao mesmo tempo, se diferencia do ambiente. Ele consegue responder satisfatoriamente às suas necessidades, fechando processos, se transformando e se abrindo a novas possibilidades em busca do crescimento e desenvolvimento saudável, mesmo que dentro dos seus limites. Esse é o resultado esperado no tratamento de pacientes esquizofrênicos.

Diante do que foi abordado quanto à compreensão da esquizofrenia através do Ciclo do Contato proposto por Jorge Ponciano, é possível propor algumas intervenções.

Com base na sintomatologia da esquizofrenia, a falta de contato com a realidade na presença de alucinações e/ou delírios mostra que na maioria das vezes não é possível uma intervenção no momento em que estas vivências acontecem para o paciente.

 Pensando na relação estabelecida entre tais fenômenos e o mecanismo da deflexão, pode-se pensar que a intervenção ocorre quando o paciente não está alucinando, delirando ou quando preserva um mínimo de contato com a realidade externa para que seja estabelecido um diálogo e incentivo à percepção de outros estímulos.


“O esquizofrênico vive a angústia da iminente desintegração do self.

Relacionar-se com alguém é o mesmo que ser destruído ou destruir o

outro. Isso justifica o seu isolamento. Dessa maneira, a forma pela qual

o indivíduo esquizofrênico é abordado é fundamental na possibilidade

de interação com o outro” (LAING, 1982 apud SANTOS, 2005, p. 181).


Como observado neste artigo, a deflexão é caracterizada por uma vaga relação com o outro, ao mesmo tempo em que surge na pessoa uma sensação de estar sendo incompreendida. 

A deflexão também pode ser pensada como uma forma de preservar o eu diante de contatos que causam sofrimento. 

O trabalho de consciência – fator de cura da deflexão – com pacientes esquizofrênicos ocorre a partir do momento em que é possível o incentivo a uma reflexão sobre si mesmo, estando mais atento ao que ocorre no meio e na relação com outras pessoas.

Na existência de alucinações e/ou delírios o terapeuta pode estar presente dando suporte à vivência. 

No período de ausência dos sintomas o trabalho é focalizado numa reflexão diante do reconhecimento desses sintomas e vivências, e da participação no que ocorre ao seu redor, inclusive na interação com outras pessoas. 

Isso pode ser incentivado diante de atividades terapêuticas e intervenções que estimule a observação do ambiente externo e a relação com seus pensamentos e vivências internas. A sensação de segurança diante do outro permitirá uma relação, mesmo que estreita e na presença desses sintomas, possibilitando o contato.

A dessensibilização está presente nos casos em que o paciente está embotado afetivamente ou não se estimula diante das várias possibilidades que são oferecidas. 

Na abordagem dos pacientes esquizofrênicos à sensação – fator de cura da dessensibilização – é preciso que a estimulação esteja sempre presente, num trabalho de incentivo ao contato, à experiência de novas relações, respeitando seus limites. 

É possível observar que com o tempo um vínculo afetivo se constrói à medida que relações de confiança surgem. Podem-se utilizar técnicas para “criar a possibilidade de que o indivíduo sinta a atenção que o terapeuta dedica a ele e incitar, progressivamente, uma focalização na própria atenção” (ROBINE, 2006, p. 107).

Para tanto, o enfoque do trabalho visará sempre o que o indivíduo traz no momento presente: o que sente, o que experimenta, o que pensa, o que percebe, o que gosta, o que evita. Deve ser uma prática frequente e rotineira a fim de despertar o paciente à percepção e interesse para novas atividades. 

A fixação vista anteriormente, pode ter relação com o pensamento concreto, delírios de perseguição e idéias fixas. Trabalhar com a existência de outras possibilidades, respeitando e aceitando as idéias do paciente, mas mostrando que outro pensamento é possível, observando o que realmente acontece, como acontece e o que faz com que a pessoa pense diferente. Através de intervenções, associadas ao vínculo terapêutico, algumas mudanças são percebidas.

No estabelecimento de qualquer intervenção é importante observar também as fronteiras de contato desse paciente. Vicentini (2007) mostra que pacientes psicóticos apresentam “uma fronteira de contato muito rígida porque suas vivências internas são tão intensas que estes pacientes podem interpretar o contato como uma ameaça a sua integridade física”

Isso significa que o terapeuta deve levar em consideração a dificuldade que o paciente tem em perceber seu senso de integridade e os limites da sua fronteira que o separam do mundo.

Por esse motivo, na relação terapêutica, como afirma Vicentini (2007), é importante perceber a fronteira de contato estabelecida entre paciente e terapeuta. Alguns pacientes esquizofrênicos se esquivam do contato enquanto outros tendem a invadir o espaço do outro com atitudes inadequadas. 

Ainda segundo a autora, a conduta deve ser diferenciada em relação à fronteira do contato identificada: ampliação da fronteira para os que apresentam um contato limitado – respeitando os limites de cada um, não indo muito além da fronteira –, e estreitamento para os invasivos, trabalhando com dados da realidade e limites.

O trabalho da Gestalt-terapia será voltado para uma ampliação da consciência do indivíduo sobre seu próprio funcionamento, observando os sintomas existentes, minimizando o sofrimento diante do encontro com o outro.

A confirmação e a presença tornam-se essenciais no processo terapêutico. A “confirmação se refere à validação da experiência do outro. Não o ato de aceitar ou concordar, mas compreender e autenticar a experiência do outro como sendo possível, válida e real” (SANTOS, 2005, p. 181).

Santos (2005) expõe sua prática com pacientes esquizofrênicos apontando para a possibilidade de se estabelecer vínculo nesses casos. “Vínculos talvez mais frágeis que, se levada em consideração a condição do ser esquizofrênico, é uma grande conquista na história do tratamento” (SANTOS, 2005, p. 182) (grifo da autora). Ainda segundo a autora, as possibilidades de “cura” e a construção do vínculo refletem o sucesso da terapia.

Apesar de todas as possibilidades de conduta terapêutica para pacientes esquizofrênicos, é preciso atentar para a questão dos limites do outro e das dificuldades de se estabelecer contato em momentos específicos. A relação que este tipo de paciente estabelece com o mundo está perturbada, não permitindo uma total abertura para o diálogo.



Isso pode ser observado numa passagem de Buber (1965b, p. 175 apud HYCNER, 1997) quando o mesmo diz: “Posso conversar com um esquizofrênico na medida em que está disposto a incluir-me no mundo que lhe é próprio... Mas no momento em que ele se fecha nesse mundo, não posso entrar” (p. 49). Entretanto, o terapeuta não enxergará sua tentativa de contato como algo frustrado a partir do momento em que estiver disposto a aceitar a existência do outro na sua singularidade.


Considerações finais

Em relação à proposta deste trabalho, foi possível elaborar uma compreensão da sintomatologia da esquizofrenia de acordo com a abordagem gestáltica. 

No que se refere à conduta terapêutica, é importante destacar que o resultado esperado no tratamento de pacientes esquizofrênicos deverá levar em consideração as especificidades desse paciente, seus limites, seu contexto e sua realidade. 

Assim, o terapeuta não vislumbrará somente a possibilidade de cura, mas, antes de tudo, a possibilidade desse indivíduo se organizar dentro da sua sintomatologia, tornando-se responsável por si mesmo.

Não se pretendeu esgotar aqui o assunto, mas creio ter tocado em alguns pontos principais da abordagem. Ressalto aqui que o enfoque principal da Gestalt-terapia é a própria relação do indivíduo consigo mesmo e com o seu meio. 

Devido a estas particularidades, a abordagem gestáltica pode ser utilizada em busca de um desenvolvimento saudável e pessoal de qualquer indivíduo e, cada vez mais, dos que são acometidos por transtornos mentais graves.


Referências
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disorders. 4ed. Artmed. 2003.

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DELISLE, G. Personality disorders: a gestalt therapy perspective. Montreal, Québec-Canadá:
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GINGER, S. & GINGER, A. Gestalt: uma terapia do contato. São Paulo: Summus, 1995.

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HOLANDA, A. Saúde e doença em gestalt-terapia: aspectos filosóficos. Revista de Estudos de
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HYCNER, R. A base dialógica. In HYCNER, R. & JACOBS, L. Relação e cura em gestalt-terapia.
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LATNER, J. The gestalt therapy book: a holistic guide to the theory, principles, and
techniques of gestalt therapy developed by Frederick S. Perls and others. Bantam Books: New
York, 1973.

MÜLLER-GRANZOTTO, M. & MÜLLER-GRANZOTTO, R. Clínica dos ajustamentos psicóticos:
uma proposta a partir da gestalt-terapia. Revista IGT na Rede, v.5, n.8, p.3-25, 2008. Disponível
em: http://www.igt.psc.br/ojs/search.php?op=longIndex. Acesso em: 07 de junho de 2008.

PIMENTEL, A. O pensamento fenomenológico sobre o psicodiagnóstico. In Psicodiagnóstico em
gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 2003.

RIBEIRO, J. Vade-mécum da gestalt-terapia: conceitos básicos. São Paulo: Summus, 2006.
__________. O ciclo do contato: temas básicos na abordagem gestáltica. 4ed. São Paulo:
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ROBINE, J-M. O self desdobrado: perspectiva de campo em gestalt-terapia. São Paulo:
Summus, 2006.
RODRIGUES, H. Introdução à gestalt-terapia: conversando sobre os fundamentos da
abordagem gestáltica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
SANTOS, E. A esquizofrenia sob o olhar da gestalt-terapia. In: XI Encontro Goiano da Abordagem

Gestáltica. 2005, Goiânia. Anais. Goiânia: ITGT – Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt-
terapia de Goiânia, 2005. p.179-185.

SANTOS, I. Sonho e alucinações visuais: propostas fenomenológicas para sua compreensão,
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SOUZA, J. [et al.]. O diagnóstico pela lente da gestalt-terapia. Artigo publicado pela Revista de
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TENÓRIO, C. A psicopatologia e o diagnóstico numa abordagem fenomenológica-existencial.
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VICENTINI, E. Fronteira de contato em pacientes psiquiátricos institucionalizados. Núcleo de Gestalt-terapia Integrada. Campinas, p.1-3, out/2007. Disponível em:
http://www.nucleogestalt.com.br/script/det.asp?id=13. Acesso em: 03 de dezembro de 2007.

https://www.youtube.com/watch?v=R5Rr2ZzilI4  Esquizofrenia

Endereço para correspondência
Ludmila Vieira
E-mail: lud_vieira@hotmail.com
Recebido em: 05/10/2009.

Vieira http://igt.psc.br/ojs2/index.php/igtnarede/article/view/1940/2642

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Aprovado em: 07/03/2010.



PSICOPATOLOGIA - MECANISMOS DE DEFESA NA GESTALT-TERAPIA

por Graça Gouvêa

Na Gestalt-terapia o homem é visto como potencialmente saudável. Assim sendo, aquilo que se entende usualmente por mecanismos de defesa neuróticos, o Gestalt-terapeuta  compreende como formas de evitação do contato. E isto não significa apenas uma mudança de nomenclatura. A evitação de contato pode ser saudável ou patológica, conforme “sua intensidade, sua maleabilidade, o momento em que intervêm e, de uma maneira mais geral, sua oportunidade.” (GINGER e GINGER, 1995).

A ação do Gestalt-terapeuta não deve objetivar atacar, vencer ou superar as resistências quando o cliente está evitando o contato, mas, principalmente, torná-las mais conscientes ou figurais, favorecendo ao cliente realizar uma atualização ou revisão em suas crenças (introjeções) e nos hábitos correlatos a estas crenças. Hábitos estes entendidos na Gestalt-terapia como uma verdadeira fisiologia secundária (PERLS, HEFFERLINE, GOODMAN, 1997) que tendem a manter um padrão recorrente de escolhas e atitudes.

Um mecanismo de defesa por si só não é bom nem ruim. O uso que o cliente faz dele, o seu funcionamento, é o que caracteriza sua "patologia". Os mecanismos mais citados pelos diferentes autores da Gestalt-terapia são:

  1. Confluência (Perls) - É um estado de não-contato, ou um momento pré-contato. Mantida ausência de fronteira de contato. O self (si mesmo) não pode ser identificado, ausência de discriminação eu/meio; eu/outro.
  2. Introjeção (Perls) - Significa a incorporação de elementos do meio, de ideias a sentimentos, relações, valores etc. Não confundir com o conceito de introjeção da Psicanálise, pois no conceito de Perls há a implicação de um elemento que não foi assimilado. Processos de identificação com ambiente são a forma de constituição de identidade, mas a introjeção é patológica quando não permite a assimilação.
  3. Projeção (Perls) - Significa atribuir ao meio elementos fantasiados pelo próprio indivíduo. Para Perls, há aqui um deslocamento da responsabilidade do indivíduo para o meio. A projeção não patológica é o que permite, por exemplo, a empatia entre os indivíduos.
  4. Retroflexão (Perls) - Consiste em voltar para si mesmo a energia mobilizada para o contato, e fazer a si aquilo que gostaria de fazer aos outros ou no mundo ou ainda que os outros lhe fizessem. São exemplos de retroflexão (tanto patológica como saudável): morder os dentes ou cerrar os punhos para não agredir; o sadismo e o masoquismo; a fala mental etc.
  5. Deflexão (Polster) - Permite evitar o contato direto, desviando a energia de seu objeto primitivo. São exemplos: desviar o olhar; "falar sobre"; usar termos técnicos etc.
  6. Proflexão (Sylvia Croker) - Uma combinação de projeção e retroflexão, consiste em fazer ao outro aquilo que gostaríamos que o outro nos fizesse.
  7. Egotismo (Goodman) - Consiste em um reforço deliberado nas fronteiras de contato, devido a um reinvestimento de energia no ego, uma hipertrofia narcísica; pode ser uma etapa do processo terapêutico, mas enquanto um estado crônico se torna uma patologia. É um estado reforçado numa cultura hiper narcísica como a atual.

Em resumo, quanto a organização do funcionamento neurótico do ponto de vista da Gestalt-terapia, para Perls e Goodman:

  • Num ciclo de necessidades interrompidas ou Gestalten inacabadas, o organismo se repete na busca de completar o que está inacabado ou interrompido, a fim de fechar a Gestalt, mantendo um padrão de relação com o mundo que é fixado por uma fisiologia secundária (padrões de hábito).
  • O self na condição neurótica está vivendo uma interrupção na capacidade de promover o ajustamento criativo ao ambiente de forma atualizada.
  • O self se organiza através de três funções, que são aspectos temporais no processo de contato: função id (intencionalidade, fundo organismo-ambiente); função ego (escolha ativa, funções de contato, percepção e motricidade); função personalidade (identidade, narrativas, autoimagem). Um sintoma sintetiza a resolução mais criativa que o organismo pode alcançar naquele momento entre estes diferentes níveis de organização do self.

A Gestalt-terapia compreende que a consciência é um evento focalizado no presente, no aqui-e-agora, isto significa que: para perceber melhor um fenômeno 'dentro' ou 'fora' de mim mesmo, devo estar concentrado em minhas funções de contato, na relação "ser-no-mundo". 

Este fluxo de consciência é conceituado em Gestalt-terapia como "awareness"O que é o conceito de awareness?

Awareness é a apreensão, com todas as possibilidades de nossos sentidos, da ocorrência do mundo dos fenômenos dentro e fora de nós


Esta apreensão se dá no presente, no aqui-e-agora. Mesmo quando lembramos de algo do passado, o lá-e-então, o ato de lembrar está se dando no presente. 

Quando tal fluxo é interrompido significa que a consciência deixou de focalizar sua percepção sensorial atual para focalizar também uma fantasia, antecipando o futuro ou lembrando o passado. Tais fantasias são a base dos mecanismos de evitação de contato, que podem ter um funcionamento patológico.

A patologia implica não somente em evitação do contato, mas a qualidade e a funcionalidade desta evitação. Se através de uma dada percepção sensorial vem a minha consciência fantasias e imagens, o contato que estabeleço com estas pode ser extremamente criativo, e pode servir a elaboração  e assimilação de algo que foi percebido anteriormente.

No jogo entre fantasia e percepção constrói-se o sentido da experiência vivida, quanto mais a fantasia antecipa este sentido, tanto menos a percepção se dá com o fenômeno no presente e sim com as imagens e construções mentais sobre a experiência, bloqueando assim a possibilidade de ir ao encontro da novidade no campo.

O pensamento e a possibilidade de antecipar e planejar podem ser muito funcionais quando organizamos a contabilidade ou planejamos uma aula, mas se nos impedem de modificar, surpreender e criar, então estão a serviço de nossas fantasias neuróticas.

O psicoterapeuta deve combinar de forma "suficientemente boa" percepção no presente e antecipação cuidadosa, planejamento e surpresa, para ser um instrumento de mudanças criativas possibilitando ao cliente a percepção de novas "Gestalten".

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GINGER, S E GINGER, A.- GESTALT- UMA TERAPIA DO CONTATO. São Paulo: Summus, 1995.

PERLS, F.; HEFFERLINE, R.; GOODMAN, P. – GESTALT-TERAPIA. São Paulo: Summus, 1997.




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Fecundação: Os primeiros registro da matriz de todos os sentimentos de rejeição ou amor é vivido pelo ser humano, tem sua primeira experiência na FECUNDAÇÃO Por isso é necessário que a gestação seja regada de sentimentos de amor e acolhimento. Esse registro será determinante para que a pessoa apresente em sua vida características e comportamentos para toda sua vida.

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